“Emaranhado em dúvidas, parte rumo ao firmamento, a asa dói, a terra parece distante. Sem saber onde o vento o leva, ele segue sem domínio espacial de sua presença no ar. Ele reflete o destino e para no ar desafiando a gravidade em meio ao nada, a si mesmo e à politica local. A desaceleração lhe trás profunda confusão mental, desorienta o real sentido do voo e passa a observar hipnotizado um misterioso magnetismo que o leva rumo ao norte.”

Trecho do livro: “O Pássaro de Fogo” de Thiago Cóstackz.

Obra Intervenção: “Voo Torto”, da série: “A Saga da Asa”. Escultura de espelho instalada no deserto de Rio do Fogo, Rio Grande do Norte, Brasil.

 

 

“Tentáculos e negros cearás”

“Eu sempre imaginei voar sobre montanhas, mas cresci num vale. Terra baixa onde se erguem pináculos doces e verdes dos dois lados da estrada de terra cinza como restos de brasa, ruínas de outrora evocam prosperidade e horror, o ar mascavo encontra um rio sereno que refresca asas ao encontrar a solidão de um campo onde só floresce o silêncio. O céu… ah, o céu, esse aqui domina como se ele fosse a terra, o lar.
Sepulturas rachadas, serpentes e palmeiras misteriosas com troncos escuros, como se cada ser da terra que ali viveu tivesse encontrado um lar para sua alma. Elas nos encaram enfileiradas com uma certa distância inconstante entre si.
Chuva de pó preto sobre telhados de terracota, discursos em fac-símile que se conectam a ninhos violados. Capatazes algozes de sonhos sobrevivem da violação da terra e de ventres virginais que ainda nem nasceram. Monocultura que mantem o mono modus.
Os caminhos sempre se dividem pela estrada enquanto um pássaro negro e uma solitária mariposa ajudam o irromper com o silêncio dos ventos sobre o vazio.
Na colina que se ergue solene sobre o vale vive o feiticeiro, solitário em sua torre de rocha, eis Shangri-la, cercada de elementais, imaginários ou não, posso afirmar que eles estarão lá.
E quando eu, agora um ser das terras altas, volto ao vale, o tempo mais parece que sofreu o efeito do sono de medusa. Tudo continua, até mesmo a implacável saudade dessa terra e a assombrosa sensação de não mais pertencimento. Eis o vale onde me junto a um carcará e um falcão, num crepúsculo insólito e cosmicamente orgástico.”

Trecho do livro: “O Pássaro de Fogo” de Thiago Cóstackz.

 

“Decolagem”